As possíveis perspectivas do jornalismo de moda

Falar sobre o futuro da comunicação, do jornalismo de moda ou até mesmo da internet não é uma tarefa fácil, não é à toa que especialistas de diversas áreas, ao serem questionados sobre o assunto, titubearam no início. “Ser profeta do amanhã é difícil, não?”. “Eu não sei dizer, mas fico feliz com o que está acontecendo hoje”. “Não sei indicar o futuro do jornalismo, mas há quem diga que o papel tem seus dias contados, que nem mesmo livro será impresso”, dizem, respectivamente Marilda Costa, socióloga; Flávio Tenguan, produtor de moda; e Adriane Hagedorn, editora do blog "Petiscos".

O pesquisador Fernando da Rocha Pereira, no estudo “O adiantado do minuto: a internet e os novos rumos do jornalismo”, diz que as características do jornalismo na internet não podem ser traçadas de maneira fixa, já que essa mídia está constantemente se modificando e criando novas possibilidades de comunicação. “O modelo de escrita, o design, a interatividade com o leitor, a geração de recursos são alguns dos temas que serão debatidos e testados exaustivamente até se descobrir um modelo rentável para a sustentação dos produtores de notícias digitais”. 

Há, no entanto, algumas tendências que apontam um provável caminho pelo qual o jornalismo de moda seguirá na web. Traçar um panorama preciso sobre o tema pode não ser a melhor coisa a fazer, mas já é possível notar que o futuro da comunicação é, de fato, no ambiente online. Mudanças vão ocorrer, desde a maneira pela qual as pessoas acessam a internet, passando por quem sobreviverá nessa mídia fazendo jornalismo de moda, até quem ditará as tendências um futuro próximo.

Caminhos da internet 

Antes de pensar como será o jornalismo, é preciso entender como vai se configurar a rede mundial de computadores nos próximos anos. A socióloga Marilda explica que a maneira pela qual a comunicação e, até mesmo, a própria web vão se estabelecer depende de como os grupos vão se relacionar e se compor nesse ambiente, além, das inovações tecnológicas. Isso, porque, essa mídia já passou por tantas mudanças desde sua criação, que, conforme surgem as necessidades das pessoas, ela vai se moldando a elas e vice-versa.

Ela cita, por exemplo, que não há mais anonimato ao “navegar” pela rede e que, portanto, aqueles que inicialmente queriam privacidade total, não conseguem encontrar tal característica na internet. “Todo computador que se comunica pela internet é identificado com um número, chamado IP (Internet Protocol), capaz de distinguir aquela máquina de todas as outras no mundo virtual”, informa a notícia publicada no site do jornal “Folha.com”, em 08 de março de 2002. 

Assim, por onde quer que um internauta passe, ao deixar um comentário, por exemplo, é possível rastrear o número do IP e descobrir a partir de qual computador ele foi feito. Da mesma forma como isso aconteceu, novas inovações estão por vir. “Mudanças ocorrerão, sem dúvida”, frisa Marilda, que possui o mesmo pensamento que o, também, sociólogo Cláudio Gravina. Ele diz, porém, que uma tendência que deve ganhar uma proporção ainda maior é a internet como parte do cotidiano da sociedade, que passou a não viver mais sem ela.

“Se por um lado (as pessoas) se comunicam com o outro, elas não partilham”, cita Gravina, que comenta que é fácil notar tal situação numa fila de banco em que as pessoas não conversam entre si. Cada um fica “ligado” em seu celular ou acessando a internet através do aparelho, voltado, na verdade, para si próprio. Essa atitude, apesar de ser uma realidade, é alvo, inclusive, de uma crítica do sociólogo. ”É preciso desenvolver a habilidade de se preocupar com outro e com a coisa comum”.

O fato da web ser um ambiente em que não há mais anonimato mostra indícios de que a liberdade de expressão não será tão ampla quanto se imagina. Segundo a reportagem “SuperPotência: Qual é o futuro da internet?”, divulgada pela “BBC”, em 16 de março de 2010, há o receio de que a internet não continue crescendo e se modificando em conjunto com as mudanças na sociedade e não seja tão “democrática” e aberta como é atualmente em função do corporativismo, como já citou Marilda.  

Sobre o futuro do ambiente online, na reportagem consta que a rede deve se tornar cada vez  mais inteligente, com um sistema de buscas mais refinado, sendo mais fácil encontrar o que se procura. Além disso, a mídia não estará presente apenas em computadores e celulares, mas, também em carros e sensores de casas, por exemplo, fazendo com que o ato de “navegar” na rede seja mais presente na vida de cada um. “Vamos conseguir acessar a internet onde quer que estejamos, fazendo o que for, quase sem precisar de nenhum aparelho. Poderemos vê-la por nossos óculos, ou por meio de algum visor que passaríamos a usar”, diz a cientista Wendy Hall, para a reportagem da “Folha.com”.

 


O que é dito na matéria pode ser confirmado ao notar que  alguns aparelhos de televisão já saem das fábricas com a possibilidade de acesso à internet, como na figura acima, da Revista "Época". O programa "Jornal da Globo" veiculou recentemente uma reportagem sobre essa inovação tecnológica, clique aqui para conferir.

O papel da indústria no jornalismo

Enquanto há, ainda, certa liberdade na internet, o que tem estimulado e o que vai estimular o jornalismo de moda nessa mídia é a própria indústria e empresas que vislumbraram no ambiente uma forma de lucrar. “O que estimula a moda estar cada vez mais presente na internet são os sites de compras, coletivas ou não”, afirma Helena Gozzano, editora do caderno "Ela", do jornal Cruzeiro do Sul.

Em 02 de fevereiro de 2011, o site “Folha.com” divulgou um estudo sobre o número de vendas online que ocorreram em dezembro do último ano. Dados dão conta de que no mesmo mês 15,1 milhões de pessoa acessaram sites de clubes de compras, como o “Privalia”, “Priv8” e “BrandsClub”; de milhas; de cupons; de descontos; e de compras coletivas, como o “Peixe Urbano”, “Clube Urbano”, “GroupOn” e “Hoje Sim”. Em grande parte desses sites é comum encontrar ofertas relacionadas a cosméticos, beleza e roupas. 

A tendência é que os sites de compras coletivas cresçam cada vez mais, prova disso é que a audiência desse tipo de página teve um salto de 1,7 milhão, em junho de 2010, chegando a 5,6 milhões de internautas em dezembro do mesmo ano, conforme dados do instituto Ibope Nielsen Online, veiculados pelo site “Folha.com”, em 08 de novembro de 2010.  

Além disso, Helena comenta que tem recebido diariamente e-mails  de páginas de venda de sapatos pela internet,  essa é a estratégia de algumas lojas virtuais, outras físicas que encontraram na rede uma oportunidade a mais de faturar, como a “Renner”, “Marisa”, ambas especializadas em moda masculina e feminina, além de lojas de calçados e acessórios como a “Passarela” e a “Shoebiz”. A técnica em Moda e Estilismo Mariana Domitila explica que houve uma mudança radical em relação ao consumo na web, já que antigamente o comportamento de ver a foto de um produto e compra-lo sem ter a oportunidade de experimentá-lo era algo impensável. 

Mariana e Helena Gozzano concordam que hoje não há mais receio por grande parte da população ao realizar compras via internet, não é por acaso que esse comportamento tem se mostrado um hábito não somente no caso da moda, mas, também, em outros setores, como a informática, por exemplo. Maíra Goldschmidt, editora do site “Chic”, lembra, ainda, que a comunicação e o jornalismo de moda mudam, também, com essa modalidade de comércio. “Acho que a facilidade do consumidor final chegar até o que ele vê no desfile vai mudar as coisas”, explica Maíra. 

A editora explica que a marca de roupas inglesa “Burberry” já coloca à venda em seu site as peças que estão no desfile no mesmo momento de sua apresentação. Dessa forma, ela acredita que o internauta que acompanha o lançamento de uma coleção já consegue notar as tendências de uma temporada e quase que imediatamente, comprar o que deseja. “Assim, o consumidor não precisa que um jornalista diga a ele o que é legal ou não. Se ele quiser, ele compra na hora”. 

O futuro do jornalismo de moda

Quem desejar se manter na internet fazendo jornalismo de moda precisa começar a pensar nisso desde já. Nos próximos anos será necessário que a pessoa se mostre cada vez mais imprescindível e não reproduza apenas o que acontece na indústria, conforme explica Maíra Goldschmidt. Além disso, ela entende que em função da facilidade que há em acompanhar um desfile e comprar o que está na passarela, o trabalho do comunicador deverá ser diferente, sendo assim, “os jornalistas de moda vão ter que se reinventar para não ficarem fora de moda!”, frisa a editora.

Conseguir se reinventar não é fácil, exige esforço e estudo.  O produtor de moda Flávio Tenguan acredita que apenas os profissionais mais qualificados e com uma postura mais ética conseguirão se manter a longo prazo em um meio tão competitivo como é o caso da moda. “São poucas as pessoas que vão sobreviver nesse meio”, enfatiza Tenguan. 

Lúcia Castanho complementa e diz que apenas os bons devem se estabelecer e que pessoas que resolveram falar sobre moda sem gostar verdadeiramente do que fazem, que criaram sites e blogs simplesmente para ter um espaço na web devem ter cada vez menos acessos. Como exemplo de pessoa dedica e com talento que se firmou no “ambiente online”, ela cita o nome do americano Scott Schuman, do blog “The Sartorialist”, criado em 2005, e que já possui um livro publicado sobre sua página. Mas você deve estar se perguntando, o que, exatamente, ele faz para ser citado por Lúcia?

Tenguan explica que Schuman era um publicitário e designer até que resolveu “jogar tudo para o alto” e se dedicar exclusivamente a fotografar pessoas comuns nas ruas, mas que tivessem estilo, que se vestissem de modo peculiar. Atualmente, ele é referência quando o assunto é moda, de acordo com o produtor de moda. Não é à toa que, além do livro explicando como é seu dia-a-dia, o autor do blog foi tema de um documentário divulgado na internet, patrocinado pela marca de processadores de computadores "Intel".

 

 

Para ver o documentário sobre o autor do "The Sartorialist", basta clicar na imagem acima. Canal do Youtube:  "Channel Intel" 

 

Ao que tudo indica, além do empenho do jornalista de moda, outras tendências devem se concretizar em questão de pouco tempo. Uma delas é a informalidade e a descontração do texto, algo que já ocorre no jornalismo de moda feito na televisão, no impresso e no rádio, mas que deve se acentuar nos próximos anos em função da identificação que há entre o produtor de conteúdo e o receptor do mesmo. “Acho que a informalidade, não falta de qualidade, vamos deixar claro, será cada vez mais presente”, explica Heloísa Gomes, jornalista e autora do blog "Sanduíche de Algodão".

Com o avanço na tecnologia de câmeras e filmadoras digitais, bem como a facilidade na compra das mesmas, outra tendência que tem já tem “dado as caras” é a imagem sendo, ainda, mais importante, conforme diz Lukas Godoy, editor-chefe do “Homem Moderno.com”. “Acho que no futuro a internet vai ser muito mais visual do que textual. Com o fenômeno dos vídeos, vai ser difícil sobreviver sem esse tipo de suporte”, diz Godoy. Em algumas páginas já é possível  encontrar pistas de que isso já acontece, basta notar que há seções com o “look” das leitores, como é o caso do blog “Toque de Neon”, que tem uma seção exclusiva para postar as fotos que as internautas enviam. Para conferir um exemplo de "Look da Leitora", clique aqui.

Essa atitude dos internautas pode remeter até mesmo ao jornalismo colaborativo ou cidadão, aquele no qual os cidadãos comuns, não necessariamente jornalistas, enviam conteúdos, como vídeos, fotos, fotos e textos. Com o advento da web, essa interação ocorre no tempo de um “clique”, com extrema rapidez, coisa que não acontecia na televisão, no impresso e no rádio, por exemplo. São, justamente, os meios de comunicação mais tradicionais que estão constantemente no centro das discussões sobre o futuro da comunicação na rede. 

Imaginar que eles vão acabar é besteira, até porque a web ainda está se desenvolvendo e a forma de comunicar através dela, melhorando cada dia mais. O editor Godoy acredita que a constante busca pelo “furo” jornalístico, por divulgar a primeira informação, faz com que, muitas vezes, o simples ato de checar um fato não seja realizado da melhor maneira. “Nesse aspecto, talvez o conteúdo da internet seja mais raso, tamanha a pressa em se publicar algo. É o exemplo de uma revista ou jornal: se tem tempo pra apurar, pra pensar, analisar etc. Por isso acho que as revistas de moda não morrerão”, afirma.

O que terá de mudar é a forma como os meios trabalham a informação. “Nem o rádio acabou com o jornal, nem o jornal com a TV, nem tudo por conta da internet, né?”, explica Natalia que acredita que em função do imediatismo da internet, os demais produtos jornalísticos devem ter um conteúdo diferenciado. “Matérias diferentes, com focos mais profundos, ensaios cada vez mais produzidos e ideias cada vez mais diferentes sobre como utilizar as novidades”, diz a jornalista.

 

 

Patrícia Ribeiro comenta como a web auxiliou o jornalista no momento da entrevista e sobre a possibilidade de fazer jornalismo pelo "Twitter".  Figura: Patrícia Ribeiro. Canal do Youtube: "Internet: a nova moda"

  

O jornalismo de moda no ambiente online, então, deve continuar se reinventando, mas seguindo, também, os novos reordenamentos que essa mídia alcançar. Os ganhos que essa comunicação adquiriu na internet são inúmeros, como, por exemplo: a possibilidade de discutir largamente o tema, inclusive entre pessoas leigas; a interação entre emissor e receptor de mensagens; e a facilidade em encontrar informações, como cita a socióloga Marilda, que possui um amigo que não sabia dar nó em gravata e aprendeu através de um tutorial num site. Quais serão os próximos passos? Depois de compreender todas as características do jornalismo de moda feito na internet, a melhor coisa a fazer é ficar de olho nesse ambiente para conferir!